Um mito que exclui a responsabilidade

Um “clássico” da literatura empresarial, a liderança é tema recorrente sobre o qual já escrevi outras vezes e nem faz muito tempo. Mas sempre vale retomar, tantos são os aspectos a abordar porque o assunto é amplo e controverso. O mito mais divulgado, a respeito, é o da liderança inata, ou seja, a que vem do berço, junto com outros talentos e inclinações. Trata-se de uma crença tão equivocada como prejudicial.

 

É claro que algumas pessoas são melhores do que outras nesse papel e isso pode sugerir que as mais destacadas possuem características inatas e as demais, não. Em uma análise bem superficial, tais características podem ser relacionadas de forma simplista a expressões triviais como “nasceu em berço de ouro”, “filho de peixe, peixe é”, “veio de uma linhagem de líderes” etc.

 

O que muitas vezes não se considera é que quem melhor desempenha esse papel chegou a tal ponto porque se preparou bem, lapidou arestas, aprimorou-se mais do que quem não é tão bem-sucedido na mesma função. Talvez tenha tido a oportunidade de estudar e de se dedicar mais ao assunto. E essa costuma ser uma razão bem mais razoável do que o fator inato. Basta observar o que acontece com os que se destacam em diferentes profissões: do atleta ao ator, do médico ao advogado, do psicólogo ao enfermeiro. Ou seja: o padrão comum são dedicação e disciplina.

 

Este é o motivo que me leva a considerar prejudicial a crença largamente aceita de que a liderança é inata: acreditar no mito exime a pessoa de aprimorar-se no papel; ela abdica da responsabilidade, acomodando-se na prática empírica e no aprendizado por osmose. Talvez por isso tenhamos tão poucos líderes nas empresas, nas país, nas instituições em geral.

 

O que gera acomodação e impede alguém de investir no aprendizado da liderança não é a ausência do potencial que leva pessoas comuns a se transformar em líderes, mas a presença do mito de que esse potencial se limita a poucos afortunados. Nunca é demais repetir: mais do que um papel, cargo ou função, liderança é uma disciplina, que precisa ser aprendida e continuamente praticada, aprimorada.

 

Usei o adjetivo “afortunado”, quando me referi aos poucos que chegam lá. E por que qualificar assim um papel que demanda tantos sacrifícios? Porque ser líder de verdade é uma oportunidade ímpar de se transformar em uma pessoa melhor.

 

Existe desafio mais importante? Muitos poderiam ter essa chance não fosse o mito.

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