“Primeiro a obrigação, depois a devoção”.
Um velho ditado que aprendi como meus avós. Levei a sério o ensinamento e sempre coloquei as obrigações diante das devoções. Até compreender a importância, o poder e a magia da devoção.
Na tradição brasileira, as datas mais festejadas são o Natal, a Páscoa e o dia de São João. É certo que o Carnaval leva a fama, pela grande exposição na mídia, mas nada se compara às festas juninas que são comemoradas no Brasil, de ponta a ponta, sem distinção social. Os vilarejos mais distantes e pobres acendem fogueiras, assam batata doce na brasa, cozinham pinhão, fazem bolo de fubá. Isso pra ficar apenas nos comes, porque também há bebes, com aquele cheiro de pinga, gengibre, canela e caramelo no ar. Não há quem desdenhe esses folguedos, seja em escolas, paróquias, terreiros, arraiais, nos sertões e nas cidades. Com direito a fogos, mastro e rezas, além de músicas e danças – quem é que desconhece uma boa quadrilha? Uma comemoração da família, desfrutada por idosos, adultos, jovens e crianças.
A origem das festas juninas (ou joaninas) remonta à Grécia Antiga, aos rituais de fertilidade que evocavam a boa colheita. Era a gratidão pela terra, pela água, pelas sementes, pela vegetação, por tudo o que oferece uma boa safra. Sobretudo, uma homenagem à abundância.
Quem segue a tradição, sabe que a festa junina é mais do que uma quermesse bem animada. É um momento, como na antiguidade, de render graças à Mãe Natureza pela fartura. É, antes de tudo, uma festa de devoção.
E quem é o devoto? Diferente do religioso que estuda a fé, o devoto é movido pela fé. Sem questionamento. Faz parte da devoção se comprometer, servir com alegria, viver o caminho da entrega. Com confiança incondicional.
Devotos constroem comunidades. Comunidades são valores, relacionamentos, conversas, solidariedade, respeito, amor.
Para deixar a conversa bem clara, antes vale fazer uma distinção entre crença e fé. Há quem acredite porque viu: isso é crença! Há quem acredite sem ter visto: isso é fé! O devoto tem fé, por isso se entrega com total convicção. É o semeador do sim, se compromete sem lamentações, acredita na utopia, vive com naturalidade e espontaneidade.
Pode até parecer que o devoto é leviano na sua fé. Nada disso! Devoção exige coragem e ousadia. E o devoto sabe colocar o coração na frente e segue adiante, deixando por onde passa as suas melhores pegadas.
“Andar com fé eu vou,
que a fé não costuma faiá”
Gilberto Gil
Pois há paralelos entre essa realidade e a Metanoia. Enquanto educação nos negócios, a Metanoia promove o aprendizado, como processo intelectual, e a aprendizagem, como processo emocional. Ambos fazem da Metanoia um processo de educação de alto impacto. Surpreendente e único. Mas há quem avance mais e quem avance menos. Quem segue adiante, apesar dos obstáculos, e quem desiste na primeira dificuldade. Para alguns, uma experiência transformadora. Para outros, mais um rio que passou em suas vidas.
Em recente viagem à Amazônia, pude prestar ainda mais atenção nos devotos que, sem formação acadêmica ou formal, colocam à serviço seus dons e talentos, conhecimentos e habilidades, adquiridos na vivência e observação. “O pescador sabe quando o cardume de jaraqui vem chegando. Esse saber não é científico, é intuitivo. Ele nem sabe como sabe”.
A grandeza desse processo educacional é que, não necessariamente, funcione melhor para os mais intelectualizados, os mais versados nas teorias organizacionais, os mais doutos e eruditos. Funciona com maior intensidade para os mais simples, os que vivem com naturalidade. Para aqueles que chegam com a xícara vazia, certos de que a encherão com a melhor bebida. Enfim, para aqueles que têm devoção e são movidos pela fé.
Meus avós que me desculpem, mas reformulei, em boa hora e com justa razão, o velho ditado: “Primeiro a devoção, depois a obrigação”.