Deus, em sua infinita bondade, teve um desejo. Ele desejou a criação. No princípio, criou o céu e a terra. O entardecer e o amanhecer. Criou as águas, os rios e mar. As matas e os campos. Os morros e as montanhas. As árvores e as florestas. Criou as frutas e os frutos. As ervas e as raízes. As plantas e as flores.
Tão bem se sentiu que ampliou o seu desejo. Criou as estrelas e o firmamento. Os insetos, as aves, os répteis, os peixes e os mamíferos. Tudo era bom e belo, mas ainda faltava algo, ou melhor, alguém com quem pudesse desfrutar tantas maravilhas. Alguém à sua imagem e semelhança. Então, criou o homem e a mulher.
Milhares de anos se passaram e o ser humano também acalentou seus desejos e criações, mas o mundo lentamente foi ficando menos bom e belo. Certa feita, ambicionou o lugar de Deus e a Ele propôs:
– Vá ver de perto a Terra que criou. Veja no que ela se transformou. É, agora, um lugar onde reina a discórdia e a incompreensão. Irmãos contra irmãos, famílias contra famílias, nações contra nações.
– Esse é o seu mundo – foi a resposta de Deus. O Céu é o meu lugar, a Terra é o seu lugar.
Mas o homem, persistente, não se deu por convencido. Vez e outra voltava a interpelar o supremo Criador:
– Aí no Céu é tudo muito tranquilo, reina a paz e a harmonia. Mas venha, nem que seja por apenas um dia, visitar a Terra, para ver as desgraças que acontecem. Guerras, crimes, violência, corrupção.
– Esse é o seu mundo – frisava Deus, em sua santa calma.
– Só um pouquinho – teimava o homem.
Um dia, diante de tamanha obstinação, Deus resolveu atender ao pedido. A partir daquele momento, o homem tomou o lugar de Deus e não mais o devolveu.
Ao mesmo tempo, nunca mais teve paz. Padece de males profundos: a culpa (“O que foi que fiz! Eu traí Deus!”), a dúvida (“Será que Ele ainda me ama?”), a rejeição (“Ele não vai mais me aceitar”) e o medo (“E se Ele voltar com a sua fúria!”). A culpa, a dúvida, a rejeição e o medo nunca mais deixaram de afligi-lo.
Mas, em sua infinita bondade, Deus não desiste de seus filhos. E, mesmo destronado, o Velho retorna todos os anos como Menino. Com a sutil e sagrada ideia de resgatar a Primeira Intenção que habita o coração de todos os meninos e meninas da Terra, antes de se tornarem adultos revestidos de segundas intenções.
O solene ritual se repete, ano a ano, para reacender a chama da essência divina, a mesma do desejo primordial, em cada um dos seres humanos.
Esse ritual sagrado tem o nome de Natal.