Ainda me lembro quando o vi pela última vez, sentado sobre uma mesa e balançando as pernas suspensas. Sem script, sem slides, sem nenhum recurso instrucional ou didático. Estávamos no Clube Hebraica, em São Paulo, durante evento para líderes empresariais.
Era um sonho assisti-lo, eu que já havia lido e estudado muitos de seus livros e o tinha como uma referência de consultor e de professor, como ele gostava de ser chamado. Já passava dos oitenta anos de idade, então eu não perdi a oportunidade na sua vinda ao Brasil – quem sabe quando seria a próxima, caso houvesse.
Lá do púlpito, a frase veio fulminante, como tantas outras tão lapidares quanto: “90% do que nós chamamos de administrar consiste em dificultar as coisas para as pessoas”.
Peter Drucker, o pai da administração empresarial, mantinha-se lúcido como sempre foi em sua fecunda carreira. Lembro-me dele e de sua frase por conta de uma súplica muito comum que colaboradores fazem a seus líderes, desde que esses tenham ouvidos de ouvir: “facilite a minha vida!”.
Às vezes são muitas as cancelas que precisam ser ultrapassadas para que o colaborador consiga fazer o seu trabalho. Com a autonomia restrita, resta-lhe acatar a autoridade do chefe.
Entregam-lhe o texto (a tarefa a ser feita), mas sem o contexto (a visão do todo). E tudo a toque de caixa! Isso quando sua apertada agenda não é interrompida e submetida à do líder. Como fazer um bom trabalho e ter um desempenho de excelência sem domínio sobre a própria agenda e prioridades?
Na lista dos afazeres, acumulam-se pendências. Sempre à espera do sinal verde para que se possa prosseguir no projeto, irremediavelmente acelerado quando a permissão for dada.
Sim, todo líder deseja contar com um colaborador comprometido. O comprometimento é uma energia psíquica e emocional fundamental para que a pessoa se entregue com afinco ao seu trabalho. Todos gostamos de experimentar essa boa energia. Mas ela não se sustenta diante de cancelas em série, de ordens e contraordens, de mensagens e contra mensagens, de mudanças contínuas de prioridades e de baixa autonomia.
As complicações diárias são atordoantes e, uma vez atarantados, nada parece melhor do que buscar uma dose de dopamina na química das redes sociais. Trata-se de um mecanismo de defesa a que muitos recorrem enquanto o comprometimento vai minguando aos poucos.
Para quem está na embarcação, duas coisas são aflitivas: olhar para a gávea e vê-la vazia; olhar para o lado e deparar-se com o líder atrapalhando no convés. Daí que o velho Peter Drucker sabia do que estava falando.
Capital Relacional não é apenas ter ciência de seu significado, mas agir de forma que o comprometimento se mantenha elevado na equipe de trabalho.