A máscara da ética

Ninguém é ético sozinho. Só somos éticos na relação com o outro. Isoladamente, ela de nada serve, senão como traço de caráter. Ética implica convivência; sobretudo, saber conviver. Um freio, portanto, à liberdade individual, cujo direito é válido enquanto não interfere na liberdade do outro. O respeito a esse limite é fundamental nas interações. 

Ética, portanto, é o conjunto de princípios e valores de convivência, tacitamente aceitos. Nós os aceitamos e os respeitamos, praticando-os por reconhecer que tal atitude é a melhor para o coletivo, mesmo que represente limitações para nós. Essa é uma forma de compreender a ética. Não a única, porém. Eis que entra em cena outro tipo de ética: a da conveniência. 

Se a convivência prevalecesse sobre a conveniência, as leis seriam desnecessárias. Mas, entre uma e outra, existem estágios diversos de consciência a exigir a força das regulamentações, sobrepondo-se ao individual como preservação do coletivo. 

Diante da maior pandemia da nossa história, há quem se recuse a fazer uso das máscaras de proteção. Coloca em risco a convivência em benefício da conveniência. Já está mais do que explicado: o uso de máscaras não serve como autoproteção, mas sim um cuidado para com o outro. Seu uso é uma questão ética.

Pessoas estão sendo multadas por trafegarem sem máscaras na orla do Rio de Janeiro e de outras cidades onde são obrigatórias. Alguns ficam revoltados com a imposição; outros, com a punição. O que faz com que prefiram a conveniência à convivência? Diante da escolha, surge o dilema ético. O que faz cada um de nós decidir por uma alternativa ao invés da outra? Consciência é uma boa resposta.

A máscara é um exemplo flagrante do momento atual, mas quem se nega a usá-la aposto que tem a mesma “consciência” que lhe permite atravessar o semáforo vermelho, burlar o fisco, furar a fila, trafegar na pista de acostamento, jogar a latinha de cerveja para fora da janela do carro. Aquela mesma “consciência” que transforma as relações sujeito/sujeito de boa convivência em relações objeto/objeto por mera conveniência.

“Tudo posso, mas nem tudo me convém” – ou nem tudo me é conveniente – disse Paulo, depois que deixou de ser Saulo. Houve, naquele momento, uma tomada de consciência. Transformar o conveniente em convivente é a metanoia que todos precisamos fazer. A mesma que faz com que as leis de dentro possam, um dia quem sabe, tornar desnecessárias as leis de fora. 

Para o bem de todos e de cada um, em particular. Amém.

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