Zeus não teve dificuldades de escolher, entre os seus familiares, aquele que seria o deus do comércio. Sem pensar muito, elegeu Hermes. A ele coube a incumbência de promover o intercâmbio mercantil, a assinatura de tratados e assegurar a liberdade das transações comerciais. Só para lembrar, Hermes é aquele que tinha sandálias com asinhas e foi escolhido por Zeus porque era o que sabia mentir melhor. Quem sabe esteja aí o que explica tantas manhas e artimanhas no mundo dos negócios.
O comércio é o primórdio do que, mais tarde, vai se moldar como ciência, a economia. No que tange a ética, é diferente de outra ciência, a medicina. Essa, por meio de Hipócrates, o pai da medicina, ganhou um juramento que leva o seu nome, resumindo os princípios éticos que ainda hoje serve como guia à profissão. Eu, como economista, não tenho lembranças de ter feito algum tipo de juramento quando da minha formatura. Talvez por essa razão, a velha economia carece de ética.
Apenas para lembrar, ética é o ramo da filosofia que lida com o que é moralmente bom ou mau, certo ou errado. Tome como exemplo a seguinte informação: no começo desse século, bilhões de pessoas ainda enfrentam privações extremas enquanto o 1% das pessoas mais ricas possui metade da riqueza financeira do mundo. Como pode ser constatado, Hermes precisa aprender ética e a economia tem muito a aprender com a medicina.
Alguns princípios do Juramento de Hipócrates talvez possam inspirar Hermes:
Priorizar o paciente
Para isso, a economia terá de pensar mais nas pessoas que passam fome do que na safra de grãos.
Não causar nenhum dano ou mal
Para isso, a economia terá de substituir a obsessão pelo crescimento e dar lugar à prosperidade dos seres humanos.
Tratar a pessoa inteira, não apenas o sintoma
Para isso, a economia deverá deixar de enaltecer o homo economicus, carente, egoísta e ganancioso, para dar lugar ao ser humano integral, desejoso, generoso e solidário.
Assim como a medicina, a economia também tem pai. Trata-se de Adam Smith, autor do clássico A Riqueza das Nações. Antes, no entanto, publicou o intrigante A teoria dos sentimentos morais, em que diz:
“Por mais egoísta que se creia ser o homem, existem, evidentemente, alguns princípios em sua natureza que o fazem se interessar pela bem-aventurança dos outros, e tornam a felicidade dos outros necessária para ele, embora ele não obtenha nada com isso, exceto o prazer de observá-la.”
Então, a culpa só pode ser do Hermes.