Sempre que viajo por terra fico intrigado com aqueles casebres isolados, fincados ao pé das serras, em meio à vegetação. Quem mora ali? Vive de quê? Convive com quem? A paisagem bucólica sugere paz, mas também solidão. Como será viver apenas entre plantas e animais silvestres?
Fico imaginando e penso que o habitante de uma daquelas casinhas talvez nunca tenha arriscado subir o monte próximo a sua choupana. Quem sabe, jamais o escalou. De onde mora, consegue avistar o cume coberto de vegetação e a curiosidade aumenta, desejando ver de perto o que existe lá. Mas, por uma razão ou outra, sempre acaba adiando a subida.
O trajeto deve ser de uns quinze quilômetros e tomaria boa parte do seu dia. Seria preciso sair ainda antes do nascer do sol para que a jornada não atrapalhasse os afazeres do dia, cuidar das plantações, criações e refeições. Para isso, ele teria de ter uma lamparina para andar no escuro.
Depois de tanto tempo desejando subir o monte, é possível que ele resolva tomar a iniciativa naquele dia. Está tão animado com a decisão que mal consegue pregar o olho. Levanta-se às duas da manhã e começa a sua jornada. Caminha pouco mais de um quilômetro e para. Uma nova questão se instala em sua mente. Ao sair de casa, notou que era noite de lua nova, de maneira que a escuridão era intensa nos arredores. Embora portasse uma lamparina, ela mal iluminava dez passos à frente.
Adentrar naquela escuridão enxergando tão pouco – pensa – é como enfrentar um grande e caudaloso rio com uma canoa bem rudimentar. Resolve, então, sentar-se em uma pedra para aguardar o nascer do sol.
Passa por ele um velho saído não se sabe de onde e que segue em direção ao monte. Carrega uma lamparina ainda menor que a do habitante solitário, que puxa conversa e revela o seu receio. O velho começa a rir e diz:
– Se você consegue enxergar dez passos à frente, caminhe só até onde pode ver. Depois disso, enxergará os próximos dez passos. Vá seguindo em frente. Com a minha pequena lamparina eu só enxergo um passo à frente. Basta para eu chegar onde quiser.
Antes do amanhecer, o ermitão já se encontra no ápice do monte.
Concluída a minha imaginação, caio na real. E avalio o quanto aguardamos, retardamos e procrastinamos para conquistar algo que desejamos. De nada adianta ficar pensando “Ah, se eu tivesse uma lamparina melhor…”. A lamparina é a metáfora para outras desculpas, tanto físicas como intelectuais. Se mirarmos a falta, ficaremos sempre de braços cruzados. E, de braços cruzados, nada conseguimos.
É preciso dar o passo desbravador. Quem chega é quem age, não quem fica só pensando.
Quando estaremos prontos? Não importa se enxergamos apenas um palmo à frente do nariz. Vamos dar o passo. No primeiro estão contidos todos os demais.
Vale para mim, vale para você: levante-se e ande!