Vê se não complica!

A nossa língua é mesmo complexa. Refiro-me, aqui, à portuguesa, apenas para não deixar dúvidas. É bom esclarecer, antes de mais nada, porque a palavra língua significa tanto um órgão muscular situado na boca e na faringe como também um idioma. Se a consulta foi feita ao dicionário, a complicação aumenta muito, tantas são as definições possíveis.

E esse é apenas um exemplo. Se escolhermos outro vocábulo, a coisa pode ficar ainda mais difícil. Vamos à própria palavra complexo. Indica algo difícil, incompreensível, intrincado, obscuro, complicado, portanto. Exemplo: estamos diante de um problema complexo. Mas pode, também, representar um conjunto de elementos, como um complexo empresarial ou mesmo uma fórmula medicinal, do tipo complexo B ou C de vitaminas.

A amplitude da palavra complexo não para por aí. Pode denominar, ainda, problemas de comportamento, como inquietação, preocupação, timidez, desvio, distúrbio, disfunção e… complicação. Não por acaso, é usada para nominar quadros psicanalíticos, entre os quais o tão falado   complexo de Édipo e os menos conhecidos complexos de Electra e de Jonas. Como se vê, a coisa vai longe. Tudo isso para mostrar a complexidade da vida.

Se duvida, na mesma linha comportamental, vamos lembrar outros dois complexos bem comuns. O primeiro é o complexo de inferioridade. Causa muita dor para quem é vítima dele, pois significa ser menos do que outra pessoa, de alguma forma. E não pense que tal comparação ou equiparação, nesse caso, possa servir de estímulo ou desafio para o crescimento de quem se considera abaixo. No entanto, é corriqueiro que pais, professores e líderes façam tal nivelamento com a intenção de desafiar o filho, o aluno ou o colaborador inferiorizado a mudar de atitude. Bobagem, a tentativa desastrada causa exatamente o efeito contrário. A vítima se sente cada vez mais impotente, fugindo das dificuldades ao invés de enfrentá-las.

Talvez pudéssemos imaginar que melhor seria, então, o segundo exemplo: um complexo de superioridade. Mas é apenas outro tipo de dor, pois ambos são faces da mesma moeda. Por vezes, a superioridade é uma compensação do próprio complexo de inferioridade, de maneira que a vítima procura mascarar sua fragilidade com elementos externos (pode ser um carro, uma roupa de grife, uma joia ou uma viagem), na tentativa de parecer maior que os outros.

Quem já não ouviu dizer que “a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional”? Podemos sentir a dor da inferioridade e da superioridade, mas assumir ou não fará toda a diferença!

A primeira coisa a ser feita é deixar de ser complexo. Plica, em latim, é o mesmo que “dobra”. Quando algo está envolto em dobras esse algo está com-plicado. Sim-plex é descom-plicar. Ser simples nos leva para à justa medida: nem inferior nem superior. É algo bem possível se você evitar a armadilha da comparação e da equiparação para reconhecer-se como um ser único. Incomparável, portanto! E descomplicado.

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